Na terceira e última parte da matéria especial da Folha de São Paulo, foco principal do texto, a comemoração de 100 anos do Kurosawa. O jornal decide investigar a história dos 4 principais cinemas japoneses que existiam no bairro da Liberdade, em São Paulo.
É uma pena que no centenário do Kurosawa, pouco sobrou do país. Seja porque Cine Niteroi teve que ser demolido para construção da avenida Radial Leste-Oeste. Hoje, o que sobrou no lugar é um jardim mal preservado que não faz jus a importância que esse cinema teve no país.
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Texto da Folha de São Paulo
Nos tempos de Kurosawa
No dia do centenário do maior cineasta japonês, morto em 1998, Folha recolhe lembranças do famoso circuito de cinemas da Liberdade
Fachada do Cine Niterói, que funcionou na av.Galvão Bueno entre 1953 e 1968, junto com restaurante, hotel e salão de festas
FERNANDA EZABELLA
REPORTAGEM LOCAL
A casa que lotava para ver o tilintar das espadas de samurai, nos filmes épicos de Akira Kurosawa, hoje só enche em dia de evento gospel. No bairro da Liberdade, em São Paulo, não há mais rastros da efervescência cinéfila da colônia japonesa, que por três décadas viu nascer e morrer quatro salas de cinema exclusivas para filmes japoneses: Cine Niterói, Cine Tokyo, Cine Nippon e Cine Jóia.
Na ocasião do centenário de Kurosawa (comemorado hoje), o mais importante cineasta japonês, morto em 1998 aos 88 anos, a reportagem foi atrás das memórias dos frequentadores desse circuito da Liberdade, que chegavam a dar volta no quarteirão em dia de lançamento, eles de terno e gravata, elas de vestido.
A sala mais antiga, o Cine Niterói, foi construída do zero, em 1953. Além dos dois andares de cinema, com 1.500 poltronas, havia um restaurante, um hotel e um salão de festas que chegou a receber exposições de Manabu Mabe (1924-1997).
“O cinema foi construído com muito feijão”, lembra o japonês Susumu Tanaka, 96, sobre os carregamentos que fazia por fazendas do interior do Paraná, que ajudaram a pagar o empreendimento do irmão mais velho. “Deixávamos de jantar e ia todo mundo ao cinema”, diz Tanaka, que deixou a cidade de Osaka aos 10 anos.
Com a chegada dos outros três cinemas, distribuidoras japonesas se instalaram na região e passaram a trazer astros para divulgar os filmes, como Toshiro Mifune, o predileto de Kurosawa, e Yuzo Kayama, uma espécie de Roberto Carlos oriental. As companhias também ganharam exclusividade nas salas: a Toho, por exemplo, que tinha obras de Kurosawa e Eizo Sugawa, se aliou ao Cine Tóquio e, mais tarde, ao Jóia.
“O Cine Jóia era todo esculhambado, sujo, os banheiros cheiravam mal”, lembra o monge budista Ricardo Mario Gonçalves, 68, que na época era um badalado tradutor de legendas da Toho, incluindo diversos de Kurosawa, como “Viver” e “Trono Manchado de Sangue”. “Já o Nippon era o mais jeitosinho, as meninas todas uniformizadas, como aeromoças.”
O “menos” japonês
A fama de Kurosawa, que já naquela época era considerado um gênio, ganhador de diversos festivais e um Oscar por “Rashomon” (1950), fazia com que seus filmes fossem além da Liberdade, chegando também ao Ipiranga ou Odeon. Isso levou muitos cinéfilos que viviam no circuito japonês a tachar a obra de Kurosawa de “muito ocidentalizada” ou “carne de vaca”.
“Rejeitar Kurosawa virou um sinal de distinção”, conta o pesquisador Alexandre Kishimoto, autor de uma tese sobre os cinemas, apresentada neste mês na USP. “Os não-nikkei [não descendente de japonês] que passaram a frequentar as salas da Liberdade tiveram a oportunidade de conhecer muito mais do cinema japonês do que só os filmes de sucesso dos festivais.” Foi assim que críticos e cineastas brasileiros, como Carlos Reichenbach, passaram a conhecer, antes mesmo dos europeus, japoneses como Ozu, Naruse e Gosho.
Até mesmo em pequenas cidades do interior tinha cinema japonês. Minha mãe, que morava em Londrina, dizia que haviam vários cinemas japoneses distribuidos por toda a região (Londrina e cidades vizinhas).Era sagrados as famílias nikkeis irem assistir filmes japoneses no fim de semana
Pelos anos 60, ainda jovem, levei uma namorada ao cine niteroi, que existiu na esquina da rua barao de Iguape com Av. Liberdade.(defronte a Casa de Portugal). Rodava um filme Japones sobre samurais. Surgiu uma cena, dentro do filme, que um dos samurais pega sua espada ou adaga(sei la como se chamava isso) e arrancou a cabeça de seu adversario, esguichando sangue. Minha namorada, pela contundência da cena, sentiu-se mal, e tivemos que nos retirar da plateia. Sabia que os filmes japoneses sobre samurais eram sangrentos, mas nao pensei que tivesse que sair do cinema por causa disso. Fica aqui meu registro. abraços a todos.