A franquia Power Rangers é um ícone mundial reconhecido há mais de duas décadas. No Brasil, a série foi uma febre nos anos 90 e mesmo que continue com as temporadas atuais, muita gente ainda lembra e se recorda de Mighty morphin Power Rangers.
Mas como seria um filme se livrando de todos os conceitos da série original e criando uma nova roupagem para uma nova geração? Como tornar Power Rangers relevante para uma geração que cresceu com Vingadores no cinema?
Esse trabalho recaiu a Dean Israelite que não só cuidou esteticamente dos Power Rangers, mas deu uma profundidade que nunca antes as séries originais deram tal abertura.
Power Rangers X Super Sentai
Antes de falar do filme, temos que lembrar e talvez relembrar que Power Rangers é uma adaptação ocidental do gênero Super Sentai criado em 1975.
No Brasil, tivemos o privilégio de conhecer algumas séries desse gênero com Google Five, Changeman, Flashman e Maskman. Infelizmente o gênero saturou e nunca mais tivemos séries desse gênero no Brasil.
Por que falar disso? Porque foi com a série Himitsu Sentai Goranger em 1975 que o gênero consolidou 5 guerreiros coloridos, chefiados por um líder vermelho. Não foi a primeira série que usou lycra e nem robôs gigantes, mas foi o primeiro passo de uma série de clichês que tornou o gênero Super Sentai conhecido mundialmente.
Em 1993, tivemos Kyouryuu Sentai Zyuranger, que apresentava cinco guerreiros descendentes dos dinossauros que defendia a Terra da bruxa Bandora. Essa série foi utilizada por Haim Saban para o público americano, aonde tirava as cenas de atores japoneses e refilmava com americanos, colocando uma nova história de cinco jovens com garra contra a bruxa Rita Repulsa, assim nascendo Mighty Morphin Power Rangers. Inserindo uma trilha sonora com uma pegada de rock assinada por Ron Wasserman, a série se tornou um enorme sucesso comercial e talvez a representação do que foi os anos 90.
Se passaram 20 anos desde então e a nossa concepção de Heróis mudaram de 2000 pra cá com a invasão de filmes do gênero no cinema. De X-men, reboot de Spider-Man, Capitão América, Vingadores e até os filmes das trevas do Batman, acabaram influenciando uma nova geração que não vê tanta relevância em cinco heróis coloridos defendendo anualmente o mundo.
Um primeiro passo para revolução
Em 2015, um fã-filme de Power Rangers invadiu a internet, mostrando uma visão bem mais adulta e sem esperanças. Dirigida por Joseph Kahn, o filme fez barulho na internet e mesmo que indiretamente, talvez tenha influenciado e muito o que vemos nessa nova encarnação.
Mas precisava ser tão pesado como a obra do Joseph Kahn? E assim restava uma dúvida do quanto o novo filme poderia realmente ousar.
Power Rangers para uma nova geração
Dean Israelite tinha no seu currículo o Projeto Almanaque que é um bom exemplo de como mostrar os jovens hoje em dia. Mas não podemos esquecer de quem escreveu roteiro e deu tom a obra, no caso John Gatins, que também fez o recente Kong: A Ilha da Caveira. Além de John, ainda temos Matt Sazama e Burk Sharpless que fizeram Deuses do Egito e atualmente cuidam do roteiro de Perdidos do Espaço para Netflix, além de Kieran Mulroney de Sherlock Holmes: Jogo das Sombras.
Tendo um orçamento de 100 milhões de dólares, algo que a franquia nunca teve em seus filmes anteriores, a Lionsgate estava confiante em apresentar uma nova versão dos Power Rangers para uma nova geração.
Vale aqui frisar que num mundo bem mais careta que em 1994, a primeira mudança foi em mudar a etnia dos personagens, não relacionando com suas cores, algo que chegava a ser tão inocente e trivial na primeira formação (seja ela intencional ou não).
A história
O filme começa há 65 milhões de anos no passado. Num planeta cheio de dinossauros, temos Power Rangers lutando contra uma traíra em sua equipe, a Rita Repulsa, a Ranger Verde. Sendo guerreiros que utilizam o Cristal Zeo para lutar, eles sucumbem a vilania de uma guerreira que deseja ter o poder de criar e destruir.
Em poucos minutos em cena, vemos a morte da ranger amarela e Zordon como Ranger Vermelho e orquestrando um plano junto de Alpha 5 para sucumbir Rita Repulsa e preparar as moedas do poder para uma nova geração. Assim, Rita Repulsa é exterminada e sendo jogada no mar, enquanto Zordon abria mão de seu poder como Ranger Vermelho.
Nos dias atuais, temos Jason Scott sendo punido na escola por uma brincadeira no vestiário do time de futebol americano. A punição além de semanas sem ir na aula, acaba também indo para um castigo de sábado, sendo repreendido por seu pai em como desgraçou sua carreira como jogador.
Nessa turma de sábado, também temos a linda Kimberly Hart que também foi punida por arrancar o dente de seu último namorado. Além de sofrer bullying digital, Kimberly tenta dar a cara a tapa em se livrar do que foi e representou no passado.
Também somos apresentados ao Billy Cranston, que acabou parando ali por que explodido o armário da escola. Extremamente inteligente, Billy aqui é autista, por isso tem problema de se relacionar com outras pessoas, sendo defendido pelo Jason.
Um passo para revolução
Billy agradece Jason e ao oferecer amizade, também oferece uma forma do Jason obter liberdade que infelizmente acabou perdendo com a brincadeira no vestiário no começo do filme. Essa amizade faz com que ambos vão até uma pedreira aonde o pai do Billy trabalhava, assim encontrando Kimberly que nadava ali perto, Triny que escalava ali, além de Zack que morava num trailer e sempre acaba indo ali na pedreira. Os cinco num desabamento, acabam encontrando 5 pedras coloridas e numa fuga, acabam acordando respectivamente em suas camas.
Homem Aranha ou Power Rangers?
Descobrindo no dia seguinte que ganharam poderes descomunais, eles acabam marcando de se encontrar na pedreira novamente. Ali, encontram uma caverna subterrânea que os leva numa nave alienígena e acordando o robô Alpha 5.
Alpha 5 explica que está ali há 65 milhões de anos e que seu mestre, Zordon, está ali no monitor porque tentou salvar ao tacar ele na rede de morfagem. Para o próximo passo precisava nascer uma nova geração de guerreiros e no momento que eles pegaram as moedas, eles se tornaram essa nova geração.
Todos ali duvidam de Alpha e do Zordon, ainda mais dizendo que tudo isso aconteceu, por causa do retorno de Rita Repulsa, que deve estar de volta em 11 dias. Independente disso, eles descobrem que se tornaram guerreiros, mas para terem chance contra inimigo, eles precisam treinar e liberar habilidades que deem a oportunidade de ativar a morfagem, além do traje de batalha que cada um ali despertou com sua moeda.
Enquanto isso, Rita Repulsa despertava num barco de pesca e estava em busca de tudo que era ouro. Essa busca era porque ouro a rejuvenescia, além de ser material base para a criação de Goldar, um monstro que a ajudará a retirar o cristal Zeo do planeta Terra, dando poderes inimagináveis a ela.
Diferente da série de televisão, aqui os poderes geram consequências e não será tão fácil conseguir todo poder necessário para impedir Rita, o que gera treinamento, confiança e uma equipe.
Aqui, Jason terá que lidar em como cuidar de uma equipe, entendendo cada um deles e seus problemas. É talvez verdade que Zack que deu pontapé inicial em cada um se abrir e contar seus problemas, para tornarem amigos e uma equipe, mas parte do aprendizado também vem do Zordon, que não é tão bonzinho como na série original.
Quando o roteiro fala mais que o visual
Se os trailers demonstravam poderes absurdos, roupas alienígenas e robôs que pareciam Transformers, aqui no filme propriamente dito temos um desenvolvimento de personagens que impressiona e se sobressai sobre o visual.
Trazendo adolescentes com problemas, um Zordon não tão bonzinho, além de uma Rita Repulsa bem mais malévola que a original, acabam se tornando acertos em demonstrar a mesma similaridade de Peter Parker para Homem Aranha. Um herói debaixo do traje, ele continua sendo tão humano quanto você, tendo os mesmos problemas que você tem com a sua família, escola ou trabalho.
E se no começo do filme, a sensação de detenção remetia a um “Clube dos Cinco” 2017, o desenvolvimento dos personagens acaba trazendo uma profundidade que torna os personagens bem mais humanos que a série original.
Bryan Cranston fez um Zordon merecedor da dúvida e fugiu do personagem sinônimo de bondade que morreu na série de televisão gerando uma energia positiva que acabou com todos os personagens maus do universo. Suas razões são bem egoístas e principalmente em aceitar que sua fase como Ranger Vermelho já passou, e não só utilizar esses cinco jovens como alavanca para seu retorno, tão quanto Rita Repulsa está fazendo com ouro obtido.
O ator Dacre Montgomery conseguiu homenagear muito bem a atuação de Austin St. John. Seu personagem é muito mais complexo e problemático que o Jason do Austin, mas mesmo assim, você encontrar muitas similaridades entre os dois personagens, o que provavelmente vai agradar muito os fãs da série original.
Kimberly de Amy Jo Johnson era uma ginasta, enquanto a Kimberly de Naomi Scott é uma patricinha que lida com bullying e traição de suas melhores amigas. É verdade que a “nova” Kimberly vive traumas e problemas de uma jovem que a Kimberly original não tinha, porém Naomi fez poses que a Amy fazia na série original, além de lembrar muito fisicamente a Amy.
David Yost foi o billy na série original e sofreu muito bullying nos bastidores por ser gay. Nunca escondeu isso em palestras que faz por aí, mas se perguntava se o novo Billy homenagearia o de David, coisa que não se fez, principalmente por explorar a questão de termos um guerreiro autista. RJ Cyler fez um Billy bem diferente, mas seus pensamentos rápidos são tão honestos e sinceros, quanto ao Billy do David Yost.
Na série original, Triny não foi tão bem trabalhando, acabando sendo resumida a melhor amiga da Kimberly. Acabou sendo um grande diferencial, essa nova encarnação feita por Becky G por embalar numa rebelia e rebeldia que a personagem da Thuy Trang não tinha. Além disso, Becky trouxe também a questão da personagem ser homossexual, o que fez a nova Triny ter uma batalha de aceitação na sua casa e em como lida com o mundo.
O ator Ludi Lin fez um Zack muito porra louca e talvez isso até lembre de leve o personagem original de Walter Emanuel Jones. Sua trama é contada de uma vez e na fala do próprio personagem, mas isso não torna menos interessante. Ludi fez um Zack que está ali pra dar valor a sua família, mas ao mesmo tempo, ele tenta encontrar algo que o faça seguir em frente quando sua família não estiver mais lá.
Rita Repulsa da atriz Elizabeth Banks é algo próximo de Freddy Krueger e o passado dela está conectado ao de Zordon, por mais que os dois não se encontrem em cena. Personagem brilha e Elizabeth está de parabéns em dar uma nova roupagem a Rita Repulsa, que mesmo falando as frases clássicas da série, nunca esteve tão ativa e envolvida com os Rangers, como nessa versão.
O filme tem uma boa trilha sonora com algumas homenagens a série e o primeiro filme, além de uma fotografia eficiente e definitivamente tornando um filme voltado para adolescentes e adultos, talvez afastando o público infantil que era a base da série original.
Tem referências, mas independente disso, o filme foca em sua mitologia e abraça “rede de morfagem”, “moedas do poder” e tudo que tornaram grandes marcas da série.
Recomendo assistir não só pela homenagem a série original, mas também por se levar a sério e conseguir isso em grande parte do filme.
Agradecemos em especial a Paris Filmes por ter nos convidado para a cabine do filme.