Se você é fã do cinema clássico, especialmente daquele moldado pelo cinema hollywoodiano, o novíssimo A Contadora de Filmes reconta esse tempo áureo no Chile, indo além e avançando até a chegada da televisão. Dirigido por Lone Scherfig e roteirizado em parceria com Walter Salles, Isabel Coixet e Rafa Russo, o filme chega aos cinemas esta semana, sendo uma adaptação do livro de Hernán Rivera Letelier.
Além de explorar a transformação cultural e tecnológica, o filme também retrata as mudanças que o Chile enfrentou em sua história recente, conectando o impacto da tecnologia às questões políticas e sociais.
A história
Situado principalmente nas décadas de 1960 e 1970, A Contadora de Filmes traz uma narrativa que pode parecer familiar para muitos brasileiros, seja por vivências pessoais ou por histórias passadas por pais e avós. No deserto do Atacama, conhecemos a família de María Margarita (Alondra Valenzuela), uma jovem apaixonada por cinema que frequenta sessões aos finais de semana com seu pai, Medardo (Antonio de la Torre), trabalhador das minas de sal, sua mãe, María Magnolia (Bérénice Bejo), e seus irmãos Mariano (Elian Ponce), Marcelino (Santiago Urbina) e Mirto (Beltrán Izquierdo).
Com todos os nomes da família começando com “M” por superstição de Medardo, o pai enfrenta as dificuldades do envelhecimento, evidentes na diferença de idade entre ele e María Magnolia, que chama atenção pela beleza. A mãe, por sua vez, desperta o interesse de Hauser (Daniel Brühl), gestor da empresa onde Medardo trabalha, sempre próximo da família com uma “gentileza” que esconde intenções.
Um dia, uma explosão nas minas deixa Medardo com sequelas permanentes, incapaz de andar. Sem amparo da empresa, ele perde o emprego, e a família é obrigada a abrir mão das idas ao cinema. Para manter o amor pelo cinema vivo, Medardo propõe que um dos filhos vá assistir ao filme e depois conte a história para os outros. Após testar todos os filhos, ele descobre que apenas María Margarita tem o talento de transmitir a magia do cinema com paixão e detalhes. Assim, ela se torna “A Contadora de Filmes”, cobrando pequenas quantias para narrar as histórias que assiste, atraindo cada vez mais pessoas.
Contudo, a harmonia familiar é abalada quando María Magnolia decide fugir, usando o dinheiro extra que Hauser lhe dava, deixando os filhos e o marido. Ela sonha em ser artista e realizar seus desejos, frustrados pela invalidez de Medardo e pela crise no casamento.
Anos depois, vemos uma María Margarita adolescente (Sara Becker), que continua a contar histórias enquanto enfrenta os últimos dias de seu pai. Após a morte de Medardo, Hauser oferece ajuda, conseguindo um emprego para Mariano (Francisco Díaz) nas minas. Ao mesmo tempo, revela que ainda mantém contato com María Magnolia, o que leva Margarita a descobrir o paradeiro da mãe.
Em um momento de grande tensão, María Margarita é convidada por Don Nolasco, o credor da cidade, para uma sessão privada. No entanto, o encontro toma um rumo sombrio quando suas intenções ultrapassam ouvir histórias. O evento desencadeia uma revolta em María Margarita, culminando em uma cena impactante e pesada. Posteriormente, Mariano mata Don Nolasco, mas o crime é ignorado pela comunidade, aliviada por se livrar de um opressor.
Com a chegada da década de 1970, as primeiras televisões começam a chegar ao Atacama, marcando o declínio do interesse pelo único cinema local e pelo trabalho de María Margarita como contadora de filmes. A modernidade traz despedidas inevitáveis para a jovem, incluindo a perda de seu grande amor na adolescência.
Opinião
Com sucesso nos palcos no Chile e na Itália, A Contadora de Filmes já despertou comparações com o clássico Cinema Paradiso, de Giuseppe Tornatore. Embora trilhe seu próprio caminho, a comparação é inevitável, dado o tributo ao cinema presente em ambas as obras. No entanto, o filme chileno vai além ao explorar as mudanças políticas no Chile, como a crise nas minas de sal e o golpe de estado que marcou o país.
O elenco é um dos pontos altos. Sara Becker brilha como María Margarita adolescente, enquanto Joaquín Guzmán (Marcelino) e Francisco Díaz (Mariano) mantêm o alto nível de atuação na transição entre os elencos jovem e adulto. O destaque também vai para o trabalho de Walter Salles no roteiro, que traduz o livro com sensibilidade, oferecendo um olhar cuidadoso sobre a América Latina.
Com referências a filmes americanos clássicos e um roteiro que reflete as transformações culturais e políticas da época, A Contadora de Filmes é uma obra profunda e cheia de camadas. A narrativa aborda não apenas o impacto do cinema, mas também os desafios enfrentados por uma comunidade em tempos de mudança.
Mais do que um tributo ao cinema, A Contadora de Filmes celebra o poder das histórias na união, na cura e na transformação. É uma obra que emociona, surpreende e oferece uma reflexão rica sobre o impacto da arte e da narrativa na vida das pessoas. É um filme que merece (e deve) ser visto.
Nota: 4,5 de 5
A Contadora de Filmes
Título Original: La Contadora de Películas
Direção: Lone Scherfig
Roteiro: Walter Salles, Isabel Coixet, Rafa Russo
Baseado no Livro de: Hernán Rivera Letelier
Ano de Lançamento: 2024
País de Origem: Chile / Dinamarca / Brasil
Idioma Original: Espanhol
Duração: 115 minutos
Elenco Principal: Alondra Valenzuela, Sara Becker, Antonio de la Torre, Bérénice Bejo, Daniel Brühl, Francisco Díaz, Joaquín Guzmán, Elian Ponce, Santiago Urbina, Beltrán Izquierdo
Distribuição: Diamond Filmes
Agradecimentos a Diamond Filmes pelo convite de assistir o filme antecipadamente para produção de conteúdo.