terça-feira, dezembro 3, 2024
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Crítica | ‘Éramos Crianças’ traz segredos que o tempo não consegue apagar

Com uma pegada à la IT e 20th Century Boys, e evocando o clima dos filmes dos anos 80, Éramos Crianças (Eravamo Bambini) se desenvolve em uma trama que transita entre passado e presente. Dirigido por Marco Martani, o filme apresenta um mistério intrigante, no qual um evento do passado leva antigos amigos a se reencontrarem após 20 anos.

A história gira em torno de cinco amigos de infância que seguiram caminhos diferentes, mas que retornam à vila natal na Calábria ao receberem uma mensagem enigmática. Algo trágico aconteceu no passado, algo que todos ali precisam confrontar para resolver as pendências deixadas.

A História

O filme começa com Antonio, apelidado de “Cacasotto” (interpretado por Francesco Russo), um homem introvertido e ansioso que é preso ao ser encontrado com uma faca em uma propriedade local. Durante o interrogatório, a polícia tenta descobrir o motivo de sua posse da faca, mas ele permanece em silêncio, aparentemente mais interessado no festival de fogos de artifício da vila. A investigação revela fragmentos de sua história e dos amigos: Gianluca (Lorenzo Richelmy), Margherita (Lucrezia Guidone), Andrea (Alessio Lapice) e Walter (Romano Reggiani). Cada um deles parece carregado com um trauma do passado, que transformou suas vidas de maneira irreversível.

O filme mantém o segredo central até o fim, alternando cenas da infância, onde os personagens têm cerca de 12 a 13 anos, com seus dias atuais. Gianluca se tornou um policial frustrado, impulsivo e sedento de vingança, Margherita é uma jornalista com relações conturbadas, Andrea é um viciado endividado, e Walter, agora uma estrela do rock, também enfrenta problemas familiares. Reunidos discretamente, o grupo tenta resolver o mistério, mas Andrea acaba chamando a atenção de Peppino (Giancarlo Commare), um antigo amigo do grupo e potencial novo prefeito da vila.

Peppino também traz lembranças do passado, incluindo uma cena em que seu pai o obriga a matar uma galinha, o que ele tenta, mas falha em completar. Outras memórias revelam um triângulo amoroso na infância, quando Margherita, então namorada de Gianluca, acaba se envolvendo com Walter (interpretado por Andrea Arru, da série Di4ries).

Senador e Andrea

Em meio ao reencontro com o senador, Andrea relembra o passado, reage com revolta e, logo depois, é encontrado morto por overdose, despertando a fúria de Margherita. O enredo se desenrola aos poucos, até que entendemos que a trama se passa em três momentos distintos: Antonio preso, o reencontro recente do grupo e as memórias da infância. A revelação final acontece quando Antonio, após muito relutar, conta o que de fato aconteceu naquela noite fatídica que alterou suas vidas e a história da vila.

Revelações

Os pais dos jovens no flashback

Aviso: a partir daqui há spoilers. Descobrimos que o pai de Antonio era motorista do senador e que junto dos pais das outras crianças, eles planejaram roubar uma maleta de dinheiro do senador, sendo que o dinheiro provavelmente iria para um paraíso fiscal na Suécia. Mas o plano deu errado: o senador descobre, e exige o dinheiro de volta e, apesar da devolução, acabou matando todos ali presentes, enquanto as crianças, brincando do lado de fora, presenciaram tudo.

Éramos Crianças

É esse evento traumático que motiva Gianluca a buscar vingança após tanto tempo, levando o grupo a roubar armas e facas, o que culmina na prisão de Antonio no início do filme.

Opinião

Éramos Crianças desafia o espectador a reconstruir a história em sua mente, revelando segredos fragmentados entre o passado e o presente. Diferente de IT e 20th Century Boys, o filme tem uma abordagem realista, revelando um lado sombrio do poder político no interior da Itália. A narrativa explora a sede de vingança e a sensação de impunidade, enquanto corpos dos pais dos protagonistas nunca foram encontrados, deixando para trás apenas o desejo de justiça.

O grande trunfo do filme está na construção cuidadosa da narrativa, sustentada por um elenco carismático e uma trama cheia de reviravoltas. A tensão é constante, e o único ponto discutível talvez seja o final em aberto, que deixa ao espectador a tarefa de imaginar o destino dos personagens. Apesar disso, o filme é um retrato sombrio de uma infância destruída e de uma vingança que levou duas décadas para se concretizar.

Éramos Crianças é, sem dúvida, um dos destaques do Festival de Cinema Italiano no Brasil de 2024. Com feridas que nunca cicatrizam por completo, o filme é provocativo e lembra que nem sempre os danos irreparáveis do passado permitem finais felizes.

Nota: 5 (de 5)

Éramos Crianças

Eravamo Bambini

Direção: Marco Martani
Elenco: Lorenzo Richelmy, Alessio Lapice, Lucrezia Guidone, Francesco Russo

País: Itália

Ano: 2024

Duração: 100 minutos

Gênero: Drama

Agradecimentos a organização do Festival de Cinema Italiano no Brasil pelo convite em assistir o filme para produção de conteúdo

Giuliano Peccilli
Giuliano Peccillihttp://www.jwave.com.br
Editor do JWave, Podcaster e Gamer nas horas vagas. Também trabalhou na Anime Do, Anime Pró, Neo Tokyo e Nintendo World.

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