O diretor Pablo Larraín está de volta com mais uma biografia de ícones femininos. Após retratar Jacqueline Kennedy em Jackie (2016) e a princesa Diana em Spencer (2021), chegou a vez da lendária cantora de ópera Maria Callas.
Esta trilogia explora momentos cruciais na vida dessas mulheres. Jacqueline Kennedy enfrentou a morte do presidente John F. Kennedy, enquanto Diana lidou com seu divórcio do Príncipe Charles. Já Maria Callas reflete os ecos de uma grande cantora em seus últimos dias, quando já não pisava nos palcos.
Com Angelina Jolie totalmente entregue ao papel da cantora grega, o filme começa pelo fim: o momento em que seus empregados encontram seu corpo na sala de estar. A partir daí, somos transportados para os dias que antecederam sua morte, explorando o cotidiano de Maria enquanto ela tenta retomar a carreira e enfrenta os fantasmas que a impedem de voltar a cantar.
O roteiro, assinado por Steven Knight, busca desmistificar e revelar o mundo particular de Maria Callas em seus momentos finais. Apesar de sua elegância e status, vemos como a cantora lidava com um cenário bem diferente do que viveu em seu auge.
A história
Ambientado em 1977, o filme apresenta Maria Callas ensaiando para um possível retorno aos palcos, tomando medicamentos em excesso e concedendo entrevistas para um documentário autobiográfico.
Porém, cada faceta de seu cotidiano revela camadas que a afastam da realidade. Sua governanta, Bruna (Alba Rohrwacher), aprendida em ópera graças à própria Maria, exerce um papel tão influente quanto o maestro Jeffrey Tate (Stephen Ashfield), que a ensaia para o retorno. Enquanto isso, seu mordomo Ferruccio (Pierfrancesco Favino) tenta, a todo custo, cuidar dela: chama médicos, controla os remédios e a acompanha por onde quer que vá.
Ferruccio enfrenta o desafio de lidar não apenas com a grandeza de Callas, mas também com os resquícios de seus momentos mais icônicos, que agora a assombram.
Enquanto público, somos apresentados a apresentações grandiosas do passado de Callas. Paralelamente, ela é entrevistada pelo jornalista Mandrax (Kodi Smit-McPhee), uma figura que aos poucos descobrimos ser imaginária – uma alegoria para suas memórias, reforçada pela diferença na fotografia quando ele entra em cena.
Maria, sempre altiva, gostava de ser admirada. Reservava, por exemplo, áreas externas de restaurantes para ser vista. Contudo, isso não a impedia de receber críticas. Em um momento marcante, um fã a acusa de ter faltado a uma apresentação em Nova York. Ferruccio, como sempre, intervém para resolver a situação.
Aristóteles Onassis e Jacqueline Kennedy
Conforme mergulhamos nas lembranças de Maria, a figura de Aristóteles Onassis (Haluk Bilginer) ganha destaque. O filme retrata o início do relacionamento dos dois, com Onassis abordando abertamente Maria, mesmo diante de seu então marido, Giovanni Battista Meneghini (Alessandro Bressanello). Em um cruzeiro, Onassis tenta conquistá-la, e Maria, com sua perspicácia e língua afiada, o desafia.
O filme aborda também a relação de Onassis com Jacqueline Kennedy, com quem ele se casou em 1968. Há uma cena especialmente poderosa em que Maria, grávida de Onassis, relembra o trauma da perda de seu filho. Outra cena revela um encontro com John F. Kennedy, que a convida para cantar na Casa Branca. Ela, em resposta, questiona se ele sabe onde sua esposa passava as madrugadas no iate de Onassis.
Nos últimos dias de Onassis, Maria o visita em segredo no hospital. Em uma despedida amarga, ela é humilhada pela chegada de Jacqueline, a “esposa legítima”, reforçando as mágoas que marcaram sua vida.
Uma jornada íntima
Pablo Larraín constrói uma narrativa que desconstrói a figura pública de Maria Callas, mostrando sua busca por liberdade nos últimos dias. Suas memórias remontam aos primeiros dias como cantora, na Grécia devastada pela guerra, onde já enfrentava desafios e pressões.
Com o diagnóstico final de seu médico – de que seu fígado e coração estavam falhando –, Maria se vê diante da iminência da morte. O filme culmina em uma cena emocionante, com Maria cantando pela última vez, em um momento de pura entrega e beleza.
Com uma narrativa não linear e fragmentada, Maria Callas pode parecer confuso inicialmente, como um quebra-cabeça cujas peças não se encaixam. No entanto, à medida que as histórias se desenrolam, cada lembrança e diálogo faz sentido, revelando os momentos marcantes da vida da cantora.
Musicalmente, o filme é impressionante. As apresentações são de tirar o fôlego, e embora vejamos Angelina Jolie em cena, é a verdadeira voz de Maria Callas que ouvimos. Jolie, que ensaiou ópera por sete meses, entrega uma atuação impecável, capturando a essência da personagem.
Virando fã da grandeza da cantora, é fato que gostaria de ver outras produções mostrando seu auge. Os embates com figuras emblemáticas e seu amor por Onassis dão pano para muitas outras produções sobre ela. Ao mesmo tempo, acredito que será muito difícil alguém alcançar a mesma entrega que Angelina Jolie conseguiu nesta obra.
De qualquer maneira, com uma vida de tamanha grandeza, Maria Callas é uma figura que precisava ser apresentada às novas gerações. E eu sou uma dessas gerações que sai grato do cinema por conhecer, ao menos, um pouco de sua real grandiosidade.
Nota: 4,5 (de 5)
Maria Callas
Países de Origem: Itália, Alemanha, Estados Unidos
Direção: Pablo Larraín
Roteiro: Steven Knight
Produção: Juan de Dios Larraín, Jonas Dornbach, Lorenzo Mieli, Pablo Larraín, Janine Jackowski, Maren Ade, Simone Gattoni
Elenco: Angelina Jolie, Pierfrancesco Favino, Alba Rohrwacher, Haluk Bilginer, Kodi Smit-McPhee
Direção de Fotografia: Edward Lachman
Montagem: Sofía Subercaseaux
Produção: Fremantle, The Apartment Pictures, Komplizen Film, Fabula, FilmNation Entertainment
Distribuição: Diamond Films
Estreias: 16 de janeiro
Duração: 124 minutos