Lançada em 2024, Mary & George estreou no Globoplay de surpresa, apoiando todo seu marketing em Julianne Moore. Mas, se você conhece produções LGBTQIA+ como Vermelho, Branco e Sangue Azul e Derrubando Barreiras (Handsome Devil), reconhecerá Nicholas Galitzine, que complementa a dualidade de mãe e filho da minissérie. Aqui, ele traz à tona todo o passado libertino e bissexual da Europa.
Com sete episódios, a série explora o reinado de Jaime VI e um recorte de uma Europa onde os desejos sexuais não eram escondidos (na verdade até escancarados). Mostra uma sociedade que mantém cortes com “amantes” que formam famílias, mas também vivem casos com imperadores, refletindo disputas de poder.
Inspirada no livro The King’s Assassin de Benjamin Woolley, a série mergulha nesse período conturbado da história inglesa, abordando poder, ambição e sexualidade em uma narrativa instigante.
Mas vamos falar da série?
Situada no início do século XVII, a trama se passa durante o reinado de Jaime VI da Escócia, que se tornou Jaime I da Inglaterra após a União das Coroas em 1603. Essa transição marcou uma nova era política e cultural, trazendo também tensões entre Inglaterra e Escócia, refletidas na corte.
Jaime (Tony Curran) é retratado como um monarca complexo, lidando com instabilidade política, disputas religiosas e seus controversos relacionamentos pessoais.
Mas engana-se quem pensa que o foco está em Jaime. A grande protagonista é Mary Villiers (Julianne Moore), que, após a morte de seu primeiro marido, Sir George Villiers, casa-se novamente. Usando sua inteligência e manipulação, ela garante que seu filho George (Nicholas Galitzine) receba educação e treinamento social na França.
Na França, George aprende modos refinados para conquistar o favor do rei Jaime. Não se trata apenas de educação, mas de experiências libertinas que moldam George ao status que sua mãe deseja.
Julianne Moore brilha como Mary, uma matriarca fria e calculista disposta a qualquer sacrifício. A personagem desafia normas familiares ao enviar o filho para seduzir o rei. Cada episódio torna natural essa audaciosa batalha por poder, algo chocante até mesmo para os dias atuais.
E quem foi George Villiers?
Inicialmente, um jovem simples que queria se casar em seu vilarejo. Após sua educação na França, George retorna à corte com ambição. Nicholas Galitzine entrega um George inicialmente ingênuo, mas com determinação feroz para se aproximar do rei.
Após várias tentativas, ele desperta o interesse de Jaime I, o que resulta em cenas de intensa paixão. Contudo, George enfrenta a resistência de Robert Carr, 1.º Conde de Somerset (Laurie Davidson), o favorito do rei.
O que torna Mary & George cativante é a persistência de Mary em colocar seu filho no centro do poder. Quando obstáculos surgem, ela entra em cena, e o Conde de Somerset é eliminado de maneira implacável, acusado de bruxaria, o que isola George ao lado de Jaime I.
Com a queda do Conde, George ascende na corte, enfrentando figuras históricas como Francis Bacon, Walter Raleigh e Edward Coke. Ele se torna peça-chave nos debates sobre política externa e religião, enquanto conquista cargos e poder, sentindo-se quase um rei – ou, como ele próprio acredita, um deus.
Conflitos e controvérsias
Uma das maiores polêmicas da série envolve Carlos, Príncipe de Gales (Samuel Blenkin), que tenta se casar com uma princesa espanhola. Quando as negociações fracassam, George incita um conflito entre as nações, em um comportamento prepotente que ecoa o Conde de Somerset.
Enquanto a guerra com a Espanha se aproxima, George, já Duque de Buckingham, enfrenta a fragilidade de Jaime I, debilitado por artrite, gota e cálculo renal. Aproveitando-se da situação, George dá sua cartada final: ele mata Jaime I na cama, alegando que o rei morreu em paz – com a cumplicidade de sua mãe, Mary.
Seja verdade ou não, o fato culmina na guerra com a Espanha, custando muitas vidas. Anos depois, George é assassinado a facadas em um bar por John Felton, um ex-soldado, após um flerte, encerrando sua trajetória de poder e controvérsia.
Opinião
Mary & George choca ao trazer cenas explícitas e uma realidade crua onde a disputa por poder extrapola reuniões formais e acontece em noites sórdidas. A série retrata uma época em que a bissexualidade era normalizada e relações eram aceitas – ou até incentivadas, como evidenciado pela Rainha Ana da Dinamarca (Trine Dyrholm).
Ao mesmo tempo, a série nos convida a refletir sobre um passado onde relações homoafetivas eram comuns entre mestres e pupilos ou em hierarquias de poder, como mostrado aqui entre duque e rei – algo também observado entre samurais no Japão.
As atuações memoráveis de Julianne Moore e Nicholas Galitzine destacam a brutalidade da luta por poder, acima de tudo e de todos. Julianne Moore é uma grande atriz e entrega em toda a série, enquanto Nicholas Galitzine entrega um dos personagens mais complexos da sua carreira. Ambos roubam a cena, o que faz que você não queira parar de assistir, querendo saber até aonde é o limite de ambos. O recorte histórico por mais que talvez não traga surpresas, a série é um convite para conhecer melhor o período e mergulhar em intrigas e excessos.
Embora a série flerte com a ficção, ela levanta questionamentos sobre como a história é contada e moldada por interesses. Se metade do que foi mostrado for verdade, já valeu a pena conhecer esse controverso passado.
Acerto do Globoplay, Mary & George apresenta uma visão única de um período da história distante do conhecimento comum dos brasileiros, mas que ajuda a compreender aspectos da nossa própria trajetória.
Nota: 4,5 (De 5)
Mary & George
Origem: Reino Unido
Formato: Minissérie (7 episódios)
Gênero: Drama histórico
Criador: D. C. Moore
Elenco: Julianne Moore, Nicholas Galitzine, Tony Curran
Streaming: Globoplay