Com duas indicações ao Oscar 2025, provavelmente você já ouviu falar de Flow, a animação dirigida por Gints Zilbalodis e escrita por Zilbalodis e Matīss Kaža. Concorrendo ao prêmio de Melhor Animação e, surpreendentemente, ao de Melhor Filme Internacional, ao lado de concorrentes como Emília Perez e Ainda Estou Aqui, a pergunta que fica é se o filme merece toda essa atenção. E, na real, sim, merece, entregando uma história envolvente e carismática sem diálogo algum, fazendo com que adoremos o gatinho que protagoniza o filme.
Além do Oscar 2025, Flow ganhou como melhor animação no Globo de Ouro, Associação dos Críticos de Cinema de Boston, Annecy (Prêmio do Público/Prêmio do Júri), European Film Awards, Associação dos Críticos de Cinema de Los Angeles, Círculo de Críticos de Cinema de Nova York e National Board of Review.
Todo produzido e renderizado no software Blender, Flow surpreende não só com sua qualidade técnica, mas por começar de forma singela e ir engrandecendo como uma boa jornada deve ser.
Mas vamos falar da história?
![Flow](https://www.jwave.com.br/wp-content/uploads/2025/02/FLOW-01.png)
A trama começa com um gatinho preto visivelmente com fome, que vê quatro cachorros brigando por peixes, o que o faz pegar um deles e ser perseguido pelos cães. Numa fuga alucinante, ele acaba abrindo mão do peixe, mas isso não muda o interesse dos cachorros por ele.
Só que algo está acontecendo na floresta, e diversos veados surgem fugindo de algo que logo se revela como uma enchente seguida de um tsunami. Sem tempo para pensar, todos os animais tentam escapar à sua maneira, o que leva o gato e um labrador creme a pararem em uma casa abandonada.
No dia seguinte, o gato percebe que a água continua subindo e inundando a região, obrigando-o a escalar uma enorme estátua de gato. Ainda assim, ele quase se afoga com a rapidez das águas.
Um veleiro com uma capivara surge próximo, e o gato se abriga por lá. Não esperava ver uma capivara na animação, mas suas interações com o gato são divertidíssimas, com o felino se incomodando com as moscas ao seu redor, o cheiro e até mesmo os roncos da nova companheira ao longo do dia.
Em uma viagem sem rumo a bordo do veleiro, o gato acaba caindo na água e sendo “caçado” por um pássaro-secretário (também chamado de serpentário). Voando pelos céus, ele avista estranhas colunas antes de voltar ao barco.
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Enquanto isso, o veleiro colide com uma casa construída no topo de uma árvore, chamando a atenção de um lêmure que tenta, a todo custo, guardar frascos de vidro. A capivara acaba levando um cesto de vidros para o veleiro, o que faz com que o lêmure siga viagem com eles.
Fica cada vez mais evidente que Flow mostra um mundo habitado apenas por animais, onde as construções humanas são resquícios de uma sociedade que viveu ali, mas não existe mais.
Além disso, durante toda a viagem, uma estranha baleia sempre está próxima da embarcação, chegando a salvar o gato em um dos momentos em que ele cai na água. Além disso, o labrador reencontra o gatinho, para o desagrado do próprio.
O último membro da equipe é justamente o pássaro-secretário. Em um momento em terra, o gato acaba sendo perseguido por vários pássaros-secretários, mas aquele que o encontrou no começo do filme tenta convencê-los de que ele não precisa ser morto. No entanto, seu esforço o faz ser rejeitado por seu bando.
Flow segue as águas turbulentas e retrata um mundo devastado, enquanto os animais continuam vivendo e tentando voltar à normalidade.
Indo além do spoiler
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A obra ainda dá um salto maior quando a embarcação chega à cidade onde estão aquelas colunas vistas no início do filme. Ali, os cães do começo ressurgem e reencontram o amigo labrador, enquanto o pássaro-secretário assume o lugar da capivara no cuidado do veleiro. Ele se recupera dos ferimentos causados pelos outros pássaros e consegue voar novamente.
É nesse momento que as águas começam a baixar rapidamente, fazendo com que o veleiro fique preso no topo de uma árvore, obrigando o gato a resgatar seus antigos companheiros. Com a ajuda de todos, ele consegue salvá-los, um por um.
Neste ponto, o gato se reencontra com o pássaro-secretário ao redor de uma estranha luz, que suga o pássaro para os céus, enquanto o gato é expulso dela.
Reunindo-se com os demais animais, todos acabam encontrando a baleia sucumbindo em terra, agora que as águas baixaram rapidamente.
Olhando para seus reflexos na água, todos percebem que podem confiar uns nos outros e que não são mais os mesmos depois dessa jornada.
Cena pós-créditos
Sim, Flow traz uma cena pós-créditos, em que vemos a baleia dando um enorme salto fora da água. Será que ela conseguiu voltar para o mar? Fica a questão.
Não é só opinião, mas interpretação
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Sendo uma obra visual e sem diálogos, Flow cativa o espectador ao apresentar animais agindo como tais. Nada de falas ou ações impossíveis—tudo ali é crível dentro das capacidades dos animais em situações críticas.
Encantando com sua naturalidade ao retratar um gato resmungão e mal-humorado, Flow acrescenta camadas à narrativa ao destacar a personalidade de cada animal: o cachorro leve e alegre que só quer se divertir, a capivara que faz apenas o necessário para sobreviver, o lêmure desconfiado e acumulador, e, por fim, o pássaro-secretário, que não só confia no gato como o protege no dia a dia. Cada animal tem um perfil bem definido, o que faz com que nos apeguemos a eles ao longo da história.
Ao optar por não mostrar humanos, o filme abre margem para interpretações, mas principalmente nos faz focar exclusivamente nos animais. Com casas e estruturas que mostram sinais do tempo, Flow sugere que a sociedade humana pode ter sucumbido a alguma tragédia, restando apenas os animais. Se essa é a verdade ou não, fica para o espectador interpretar.
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Outro ponto relevante é a questão da morte para os animais, exemplificada quando o pássaro-secretário entra na luz e o gato é expulso dela. Existem diversas leituras possíveis, mas a mais comum é que o pássaro tenha partido e o gato tenha tentado segui-lo, sem sucesso, pois ainda não era sua hora.
O mesmo pode ser dito da baleia e sua cena pós-créditos. Talvez ela tenha conseguido voltar para o mar, mas também pode ser interpretado que ela partiu para um “paraíso”.
Essas são apenas algumas interpretações possíveis, e talvez esse seja o maior mérito de Flow: ao escolher um final aberto, cheio de sinais e simbolismos, ele nos permite criar nossa própria versão da história e tirar nossas próprias conclusões.
Tenho certeza de que, se você assistir ao filme com amigos, família ou filhos, Flow proporcionará uma discussão saudável sobre sua narrativa e seu desfecho. E, independentemente da interpretação que cada um tiver, Flow certamente irá cativar você e sua família.
E se uma animação consegue provocar esse nível de reflexão, Flow cumpriu seu papel no cinema: contar uma boa história.
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Nota: 5 (de 5)
FLOW
Letônia – Bélgica – França | 2024 | 85 min. | Animação – Aventura – Fantasia
Título Original: Flow | Straume
Direção: Gints Zilbalodis
Roteiro: Gints Zilbalodis, Matiss Kaza
Distribuição: Mares Filmes | Alpha Filmes
Agradecimentos a Mares Filmes e a Alpha Filmes pelo convite para produção deste conteúdo