terça-feira, março 18, 2025
spot_img

Crítica | O mundo distorcido de Girassol Vermelho

O novo longa de Eder Santos, com co-direção de Thiago Villas Boas, chega aos cinemas em 20 de março pela Pandora Filmes. Destaque na Mostra de Cinema de Tiradentes de 2025, Girassol Vermelho mergulha no realismo fantástico de Murilo Rubião e propõe uma reflexão inquietante sobre controle, liberdade e identidade.

Chico Diaz lidera o elenco, que conta ainda com Luiza Lemmertz, Bárbara Paz e Daniel de Oliveira em uma participação especial. Mas não se engane: este não é um filme convencional, e sua jornada pode ser tão desconfortável quanto fascinante.

Com uma estética que remete a Dogville, Girassol Vermelho desafia o espectador a abandonar suas certezas e se perder na visão distorcida de Romeu (Chico Diaz). A princípio, ele parece apenas um homem comum, despedindo-se da esposa antes de embarcar em um trem. Mas logo essa viagem cotidiana se revela algo muito mais perturbador.

Romeu ignora as perguntas insistentes de um passageiro desconhecido, até que o trem para abruptamente e ele se vê em uma cidade bizarra, onde a lógica parece distorcida. Vagando sem rumo, ele encontra uma mulher misteriosa (Luiza Lemmertz) que, ao invés de lhe oferecer respostas, o conduz diretamente a um interrogatório. O motivo? Questionar é proibido.

A partir daí, Girassol Vermelho mergulha de cabeça em sua atmosfera opressiva. Preso em um box de vidro, Romeu é atormentado com perguntas sem sentido. A promessa de liberdade existe, mas a um preço: trair um amigo. Enquanto isso, a cidade se desenha como um pesadelo distópico, onde televisores antigos exibem discursos do um líder tão carismático quanto sinistro (Daniel de Oliveira). E no discurso é que é que o sonho é a única coisa que eles ainda não conseguem entrar na mente humana. (o que será ecoado no restante da obra)

Aos poucos, Romeu percebe que não está apenas preso fisicamente—ele está sendo moldado, desconstruído, absorvido por um sistema que busca eliminar qualquer traço de individualidade. Bárbara Paz encarna esse poder com frieza cirúrgica, representando a face humana de um mecanismo que suga mentes e almas.

Impacto visual x narrativa arrastada

Mas há um problema aqui, Girassol Vermelho parece desenvolver mais sua estética do que se cativar por sua narrativa. A construção visual é, sem dúvida, impressionante. A cidade-galpão, recheada de monitores antigos e patrulhada por veículos militares, evoca a paranoia de 1984 com uma identidade própria. O box de vidro onde Romeu é interrogado é uma alegoria brilhante sobre aprisionamento e identidade. Até mesmo o trem inicial, que não era um trem de verdade, ilustra a maneira como o filme manipula percepção e realidade.

No entanto, a trama se arrasta. Há mais tempo de tela do que história. O conceito é claro desde o início em que um sistema distópico que anula a individualidade através da repressão e do controle psicológico. Mas o filme martela essa ideia sem desenvolver camadas adicionais, extendendo o que é mostrado em tela. O resultado é um ritmo lento que pode cansar, especialmente quando a mensagem fica clara que a única fuga está na loucura ou nos sonhos.

Chico Diaz entrega um protagonista que resiste até o fim, mas de forma enigmática. Ele luta pela liberdade, mas não nos revela exatamente detalhes desta liberdade. Suas motivações ficam subentendidas, tornando sua jornada mais simbólica do que impactante.

Girassol Vermelho é, sem dúvida, uma experiência cinematográfica singular. Seus maiores méritos estão na construção imagética e na forma como desafia o espectador a aceitar sua lógica. Mas, ao final da projeção, fica a sensação de que o filme poderia ter ido além com mais substância.

Ainda assim, para aqueles que apreciam filmes que instigam mais pela atmosfera do que pela trama, Girassol Vermelho tem muito a oferecer. Não é um filme fácil, nem para todos. Mas talvez essa seja sua maior virtude.

Nota: 2,5 (de 5)

Girassol Vermelho

Direção: Eder Santos
Co-direção: Thiago Villas Boas
Produção Executiva: André Hallak, Barão Fonseca, Eder Santos, Leandro Aragão, Joana Braga
Direção de produção: André Hallak, Barão Fonseca, Joana Braga
Elenco: Chico Dias, Luiza Lemmertz, Bárbara Paz, Luah Guimarães, Mariano Mattos, Vinícius Meloni,  Aury Porto, Michelle Castro, Renato Parara, Carlos Magno, Fernanda Rodrigues, Luciano Luppi, Mônica Cerqueira, Mariana Maioline, Alexandre Vasconcelos, Fabiano Persi, Emílio Murase, Gláucia Vandeveld, Gilberto Scarpa, Adyr Assumpção, Marcelo Castro, Fabian Remy, Thaís Helt, Paulinho Santos, Lisa Cerqueira, Josefina Cerqueira, Pat C, Regina Ganz.
Ator convidado: Daniel de Oliveira

Montagem: Fabian Remy, Dan Loghin, Carlos Tribiño Mamby, Barão Fonseca
Roteiro: Mônica Cerqueira e Eder Santos
Produção: André Hallak, Barão Fonseca, Bia Flecha, Monica Cerqueira
Direção de fotografia: Stefan Ciupek
Colorista: Dirk Meier
Trilha Sonora: Paulinho Santos, Stephen Vitiello, Alê Siqueira, Pat C
Desenho de Som: Alexandre Martins, Eder Santos
Supervisor de Pós-produção: Leandro Aragão
Direção de arte: Laura Vinci,  Allen Roscoe
Figurino: Joana Porto

Agradecimentos a Pandora Filmes pelo convite para produção deste conteúdo.

Giuliano Peccilli
Giuliano Peccillihttp://www.jwave.com.br
Editor do JWave, Podcaster e Gamer nas horas vagas. Também trabalhou na Anime Do, Anime Pró, Neo Tokyo, Nintendo World e Jornal Nippon Já.

Artigos Relacionados

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Saiba como seus dados em comentários são processados.

- Advertisement -spot_img

Últimas da redação

O novo longa de Eder Santos, com co-direção de Thiago Villas Boas, chega aos cinemas em 20 de março pela Pandora Filmes. Destaque na Mostra de Cinema de Tiradentes de 2025, Girassol Vermelho mergulha no realismo fantástico de Murilo Rubião e propõe uma reflexão...Crítica | O mundo distorcido de Girassol Vermelho