segunda-feira, março 17, 2025
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Crítica | Além da despedida, Milton Bituca Nascimento conta a história da música brasileira

Saindo em grande estilo, Milton Nascimento ganhou um documentário que vai além do show, reunindo 40 lendas que não só trazem histórias, mas são organizadas e pautadas pela locução de Fernanda Montenegro.

Com direção de Flavia Moraes e roteiro dela com Marcélo Ferla, Milton Bituca Nascimento foge do esperado para um show de despedida nos cinemas, construindo narrativas que remontam à lenda que Milton Nascimento se tornou e ainda é.

No ritmo do trem

Milton Bituca Nascimento – Divulgação

Para contar essa história, o próprio Bituca também participa, trazendo lembranças da infância e como o som da locomotiva influenciou profundamente o estilo musical que viria a desenvolver.

Mas seria Bossa Nova? Jazz? O documentário apresenta lendas como Quincy Jones, que afirma ser o jazz da América do Sul, enquanto Sérgio Mendes diz que o estilo de Bituca é único, sem se encaixar totalmente nem no Jazz, nem na Bossa Nova.

Caetano Veloso enxerga a grandiosidade de Bituca como algo que transcende gêneros e incorpora influências diversas daquela época, mas sempre expressando o que o cantor sentia de maneira autêntica.

Sem respostas definitivas, Spike Lee comenta o quanto admira Milton Nascimento e não poderia deixar de homenagear o amigo. Assim, embarcamos numa turnê que começa no exterior, acompanhando o cantor em Los Angeles e Veneza, onde as cidades se tornam cenários de uma viagem que fazemos junto com ele.

Milton e Augusto conversando sobre a turnê e a adoção – Divulgação

Não tendo passado por provas por uma das melhores escolas de música no passado, hoje Milton Nascimento, com seu estilo único, se tornou doutor nela. É reconhecido internacionalmente por sua capacidade de expressar sentimentos por meio de suas músicas.

Bituca não evita questionamentos diante das câmeras, abordando a adoção do filho, a relação entre os dois e os reencontros com amigos nesta última turnê. Grato, ele reúne companheiros de outrora e uma nova geração, criando um mix de emoções que sempre foi essencial em sua mensagem para o público.

Um símbolo

Milton Bituca Nascimento – Divulgação

Ao lado de Djavan, Mano Brown e Criolo, Milton Bituca Nascimento revisita as barreiras que rompeu com seu sucesso comercial. O Brasil, ainda marcado pelas heranças da colonização portuguesa, carrega resquícios da escravidão e os ecos de uma sociedade que por muito tempo negou espaço ao negro, sugerindo sua suposta incapacidade.

O sucesso de Milton Nascimento ajudou a desmistificar essas ideias e influenciou uma sociedade mais justa, justamente por sua grandeza. Lógico que não foi fácil, mas essa trajetória aconteceu ao lado de outras figuras históricas, como Gilberto Gil, que também relembra esse período.

Chico Buarque, por sua vez, comenta as dificuldades de cantar durante a ditadura militar, enquanto Milton Nascimento conseguia driblar a censura com canções que desafiavam a compreensão dos censores da época – ainda que muitos de seus trabalhos também tenham sido censurados.

Quando parar

Milton Bituca Nascimento – Divulgação

Um dos pilares do documentário é a despedida e o reencontro, mostrando um Milton que sai da turnê mais jovem do que entrou. Mas ele queria parar? Não. No entanto, naquele momento, era o certo a se fazer. Ainda assim, nunca diga nunca, pois tamanha emoção sempre pode reacender o desejo de voltar aos palcos.

Opinião

Milton Bituca Nascimento – Divulgação

É muito difícil não se emocionar com o documentário Milton Bituca Nascimento. Ao optar por não se limitar à turnê, mas contar suas histórias, questionamentos e as mudanças que o mercado sofreu, o documentário se torna pequeno diante de tantas histórias a serem ouvidas e aprendidas.

Devo confessar que, esperando algo mais musical do que documental, Milton Bituca Nascimento foi uma grata surpresa ao optar por homenageá-lo por sua trajetória, em especial por meio dos relatos de seus amigos.

Logicamente, que descrever e tentar explicar emoções, está longe de assistir o próprio documentário que não traz só sua história, mas evoca conexões diferentes com cada telespectador e suas memórias com a música. Sendo uma experiência íntima e extremamente particular para cada um.

Com sensibilidade e sem pudor para contar histórias que nem sempre são fáceis, a produção se guia sempre por suas músicas, mostrando-as, mas sem se limitar a isso.

Com tantos depoimentos internacionais que batem na tecla de que a música é sentimento e não apenas letras, Milton Nascimento é evidenciado pelo sentimento que permeia sua obra. Mesmo que suas melodias tragam histórias profundas, é em sua interpretação que reside a intenção de contá-las e o que despertou o fascínio mundial em torno dele.

Ao trazer Fernanda Montenegro como condutora do documentário, só uma lenda poderia contar a história de outra lenda. Sua condução poética da trajetória de Bituca é intocável. Com uma edição que mistura depoimentos do próprio Bituca com os de seus convidados, uma história oral transcende as mídias e se eterniza nas telas.

Fazendo história não só na música, mas influenciando gerações até hoje, Milton Bituca Nascimento não trata apenas de sua despedida, mas de sua importância no presente e do legado que deixa.

Nota: 4,5 (de 5)

Milton Bituca Nascimento

Dirigido por Flavia Moraes
Roteiro por Marcélo Ferla e Flavia Moraes
Consultoria Artística de Augusto Nascimento
Direção de fotografia: Pedro Rocha
Montagem: Laura Brum e Flavia Moraes
Direção Musical e Trilha Sonora Original: Victor Pozas e Rafael Langoni
Música: Milton Nascimento
Produção Executiva: Liz Reis, Ana Vezzi, Gabriela Tocchio, Ana Saito, Pablo Torrecillas
Produzido por: Augusto Nascimento, Ricardo Aidar, Larissa Prado, Andre Novis, Caio Gullane, Fabiano Gullane.

Produtores associados: Flavia Moraes, Victor Pozas, Rafael Langoni
Produção: Canal Azul, Nascimento Música, Gullane e Claro
Distribuição: Gullane+

Agradecimentos a Gullane+ e a Sinny Assessoria pelo convite de assistir o documentário para produção desta crítica

Giuliano Peccilli
Giuliano Peccillihttp://www.jwave.com.br
Editor do JWave, Podcaster e Gamer nas horas vagas. Também trabalhou na Anime Do, Anime Pró, Neo Tokyo, Nintendo World e Jornal Nippon Já.

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