O último longa-metragem de José Barahona, Sobreviventes, traz à tona as complexas relações que surgem entre um grupo de sobreviventes de um naufrágio no século XIX, em uma ilha deserta. Na trama, composta por brancos e negros, a luta pela sobrevivência se transforma em um espelho das tensões históricas que marcam o legado da escravidão e do colonialismo. O filme, que estreia nos cinemas brasileiros em 24 de abril, não só marca a despedida do cineasta luso-brasileiro, falecido em novembro de 2024, como também homenageia sua trajetória e seu compromisso com o cinema político e histórico.
A Convergência de Histórias e Identidades

A história de Sobreviventes tem como ponto de partida a parceria entre Barahona e o escritor angolano José Eduardo Agualusa, conhecido por sua habilidade em explorar temas como as cicatrizes do colonialismo, a memória coletiva e as complexas relações de identidade. A colaboração entre os dois artistas resultou em um roteiro que vai além da mera reconstrução de um evento histórico, mergulhando em um espaço de reconstrução da história pessoal e coletiva.
Agualusa, que desde sua obra literária explora os efeitos da escravidão, da identidade e da memória, foi convidado por Barahona para contribuir com o roteiro de Sobreviventes. O escritor conta que sua principal missão foi dar voz aos africanos presentes na narrativa, abordando-os não como vítimas passivas, mas como sujeitos ativos na história. “Mostrar que eles nunca foram sujeitos passivos, mas sobreviventes de um processo de sequestro e de luta”, afirma Agualusa.
A Imersão de Barahona no Passado de Portugal e Brasil

A produção de Sobreviventes reflete a profunda relação do diretor com o Brasil, país que sempre o inspirou e que desempenha um papel crucial na narrativa do filme. A produtora Carolina Dias, companheira de Barahona, explica que o cineasta estava interessado em questionar o passado glorioso de Portugal, trazendo à tona uma versão não contada das “glórias” coloniais. A trama do naufrágio, com seus personagens de origens diferentes, se torna o palco perfeito para refletir sobre as escolhas de sobrevivência, seja na recriação de comportamentos coloniais ou na construção de uma nova sociedade.
Filmado entre maio e junho de 2022 em Portugal, Sobreviventes também é uma coprodução entre Brasil e Portugal, destacando o intercâmbio cultural entre os dois países. Com passagens por importantes festivais de cinema, como IndieLisboa e Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, o filme continua a dialogar com questões universais e atemporais, revelando a relevância da história na formação de nossa identidade.
Uma Trilha Sonora Que Amplifica a Mensagem

A trilha sonora de Sobreviventes é uma peça fundamental para compreender o tom emocional do filme. Composta por Philippe Seabra, da banda Plebe Rude, e enriquecida pela participação especial de Milton Nascimento, a música vai além de um simples acompanhamento. A voz inconfundível de Nascimento empresta uma dimensão ainda mais simbólica e afetiva à obra, elevando sua carga emocional e conferindo-lhe uma profundidade única.
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Um Legado Cinematográfico
Além de sua atuação como diretor, José Barahona foi também produtor e ensaísta, deixando um legado de engajamento político e cultural no cinema luso-brasileiro. Sobreviventes não é apenas uma obra que explora as tensões históricas entre colonizadores e colonizados, mas uma alegoria sobre o poder da resistência e a necessidade de reimaginar as estruturas sociais, mesmo nos momentos mais sombrios.
Com um elenco que inclui nomes como Miguel Damião, Allex Miranda, Anabela Moreira e Roberto Bomtempo, o filme promete provocar reflexões profundas sobre o nosso passado e seu impacto no presente. A estreia de Sobreviventes nos cinemas, marcada para 24 de abril, é mais do que a exibição de um filme: é a celebração da memória e do legado de um cineasta que soube, como poucos, dialogar com o nosso tempo e história.