No dia 26 de julho perdi uma pessoa muito importante na minha vida. Ele foi responsável ao menos por metade deste meu amor pelo mundo dos quadrinhos, das letras e das fantasias. Meu pai.
Lembro que desde bem pequena, quando ele ainda morava comigo, toda vez que abria sua pasta sempre encontrava ou um gibi da turma da Mônica ou da Disney (a propósito, ele imitava muito bem o Pato Donald e provavelmente é o motivo pelo qual este é meu personagem Disney favorito), com os quais fui alfabetizada.
Ele sempre queria saber como foi a escola e, quando via meus cadernos, elogiava meu progresso nas letras. Ah, como meu pai era gentil com meus garranchos, sendo que a letra dele sempre foi linda e até hoje não vi igual. Tão linda que me deixava orgulhosa e vaidosa quando escrevia nas etiquetas do meu material escolar ao longo dos anos.
Sempre acreditando no meu talento, me inscreveu num concurso de desenho da empresa onde ele trabalhava e, com seu incentivo, ganhei o primeiro lugar na minha faixa etária, uma publicação na revistinha da empresa e a casinha do Meu Querido Pônei (o clássico, não esses pôneis esquisitos de hoje em dia). Também me deu de aniversário uma boneca grandona da Mônica vestida de moleque, de boné e tudo, a qual eu deixei de lado pra brincar dentro da caixa, fazendo ele se conformar e dar risada, brincando junto comigo.
Fluente em inglês e com noções bem básicas de japonês (afinal, tinha pelo menos três dans de judô), ficava doido quando eu pronunciava alguma palavra incorretamente e ficou orgulhoso quando anunciei que tinha me formado em língua japonesa através do método Kumon.
Ele me deu as primeiras noções básicas de informática e sempre teve paciência ao me ver catando milho no teclado do computador dele (e deu pulos de alegria quando um treinamento intensivo no meu primeiro emprego me fez digitar sem olhar para as teclas, graças a um teclado sem letras). Me ajudou com paciência e dedicação nos meus trabalhos escolares, a ponto de meus professores nem terem a intenção de me devolvê-los porque queriam utilizá-los de exemplo nas turmas vindouras. Foi a uma reunião de pais e ficou surpreso e feliz quando meu professor de matemática me elogiou, pois meu pai sabia que sua filha desprezava os números tanto quanto as baratas voadoras.
Para poder me achar em qualquer canto, me presenteou com meu primeiro celular e depois ficou doido porque eu o largava sempre em casa. Ficava feliz com qualquer presente, desde uma caixa de sapatos de bigode (ah, essas professoras de primário criativas) até um carrinho em miniatura. O primeiro livro de Harry Potter que li na vida foi presente dele, junto com uma linda dedicatória, fora seus comentários quando assistia comigo à Saint Seiya (“Filha, tenho certeza que esse de armadura rosa é uma menina”).
Meu pai bombardeou-me com conselhos preciosos quando soube pela minha avó deda-dura que eu tinha ficado mocinha pela primeira vez e me consolou quando tomei meu primeiro pé na bunda.
Entre o finalzinho da minha adolescência e um pedaço da minha vida adulta, me decepcionei com algumas coisas e acabamos por nos afastar. Mesmo longe, sei que ele sempre deu um jeito de saber o que eu estava fazendo e com quem estava andando. Quando nos reaproximamos, esteve ao meu lado quando passei novamente por dificuldades amorosas (ele fez ameaças muito elegantes e criativas ao rapaz, diga-se de passagem), quando publiquei minha primeira resenha no UHQ (ficou ao meu lado durante todo o processo criativo e leu o texto primeiro do que todo mundo e achou ótimo mesmo sem conhecer Rurouni Kenshin), sempre estendia um chocolate para aliviar minha TPM e aguentou as minhas poucas tentativas culinárias (segundo ele, estava gostoso, vai saber…).
Mesmo deprimido com alguns aspectos de sua vida profissional, nunca deixou de me apoiar em minhas escolhas, de me aconselhar e me fazer sentir capaz. Quando eu me sentia frustrada e reclamava que tinha feito faculdade à toa, ele dizia que eu ainda era nova (bondade de pai, claro), que tinha a vida toda pela frente e que tinha certeza de que eu realizaria todos os meus sonhos.
Quando minha “sobrinha” (filha de minha prima que era também como filha para ele) nasceu, disse à ele que agora ele tinha uma netinha, mas meu pai marotamente disse que isso não era desculpa e depois deu uma piscada.
Meu pai acreditava em mim plenamente e sempre fez questão de enaltecer meus talentos. Quando me mandava mensagens pelo Facebook, sempre escolhia para finalizar o assunto um um cãozinho simpático segurando um coração na boca, e isso sempre me enchia de ternura.
Nas últimas semanas que passamos juntos ele ainda teve oportunidade de reforçar que nunca deixou de acreditar que eu seria muito feliz e se alegrou com meus relatos sobre meu cotidiano tão normal, mas do qual ele sentia tanta falta.
Meu herói partiu como um verdadeiro guerreiro: finalmente estava em paz, ao redor das pessoas que amava, depois de uma dura batalha contra um inimigo poderoso e cruel. Nunca irei esquecer essas cenas, mas em contrapartida também nunca esquecerei o quanto meu pai amava a mim e o quanto se preocupava com essa sua filha cabeçuda.
Depois de tudo, enquanto ensaiávamos como dar a notícia para minha avó, no meio daquela dor toda uma pequena heroína me fez ter forças para aguentar todo aquele tranco. Minha sobrinha, no alto de sua inocência, sorriu para mim. E é por isso que ela está nesta foto que ilustra esta homenagem, que traz meu pai como ele era e como quero me lembrar dele para sempre.
Por último mas não menos importante, quero agradecer a todos os meus companheiros do JWave (que me deram muita força para suportar tanta tristeza), minha família e meus amigos, que não deixam a minha peteca cair. E quero te dizer, papai Luiz, que você pode ficar tranquilo. Essa sua filha cabeçuda não está sozinha e vai se esforçar para fazer você sentir orgulho. Fique em paz e olhe por mim daí de cima.
Ps: Essa é a nossa homenagem do JWave a uma das redatoras mais queridas aqui em nosso site, a Luana, como também ao seu pai que foi uma grande influência em sua vida. Nos últimos dias perdemos algumas pessoas queridas e acreditamos que seja bom reconfortar e relembrar o quanto elas nos motivou em seguir em frente. Agradecemos aos leitores e ouvintes do JWave por essa reflexão.
Que triste. Força Luana, pra vc e sua familia